Seminário no TRT-15 discute os prejuízos do trabalho infantil

fotos: Denis Simas
Por Ademar Lopes Junior
 
“Trabalho infantil: Infância perdida, educação comprometida, exclusão inevitável” foi o tema do Seminário realizado nesta sexta-feira, 6/12, no auditório do Plenário da Corte Trabalhista   da 15ª Região, em Campinas, e que reuniu magistrados, procuradores, professores, estudantes e outros convidados para as palestras e o debate do tema organizado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por meio de seu Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem. 
Antes do início dos trabalhos, um grupo de nove músicos da Orquestra Filarmônica dos Patrulheiros de Campinas, regidos pelo maestro Douglas Vieira, executou alguns números musicais da Música Popular Brasileira, como Manhã de Carnaval, Eu sei que vou te amar, O canto do pajé, Dom de iludir, entre outros.
A vice-presidente judicial da 15ª, desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani, presidiu a Mesa Alta ao lado do desembargador João Batista Martins César, presidente do Comitê organizador do evento e membro da Comissão Nacional do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). Também compuseram a Mesa o arcebispo de Campinas, Dom João Inácio Müller, o desembargador Ricardo Regis Laraia, representando a Escola Judicial da 15ª, o procurador-chefe do MPT em Campinas, Dimas Moreira da Silva, e o gerente regional em Campinas da Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia, Carlos Alberto de Oliveira.
 
Jornada missionária
 
 
A desembargadora Tereza Asta ressaltou a importância do evento como um espaço para o debate de ideias e a construção de soluções relacionadas ao combate do trabalho infantil, e justificou a participação do TRT-15 com defensor de um programa que tem como principal objetivo garantir direitos de crianças e adolescentes contra a exploração do trabalho infantil que representa, segundo a magistrada, uma forma de “exclusão dos meios de subsistência e da cidadania”.
 
 
O arcebispo de Campinas, Dom João Inácio Müller, salientou a bem-sucedida parceria do TRT-15 com a Igreja Católica nos projetos de combate ao trabalho infantil e destacou o compromisso do seminário como a busca de ações que visem “superar a situação de miséria”.
 
 
O procurador-chefe do MPT, Dimas Moreira da Silva, num discurso emocionado, criticou a vulnerabilidade de crianças brasileiras expostas ao trabalho infantil, mas também ao descaso do Poder Público, que não garante os direitos mínimos de cidadania aos pobres, aos negros, aos índios e também às crianças. O procurador lembrou ainda que a luta pela inclusão da criança na escola não é só do Poder Judiciário, mas do Ministério Público, da Igreja e de toda a sociedade.
 
 
O gerente regional Carlos Alberto de Oliveira chamou o evento de “jornada missionária” e ressaltou o papel “do trabalho e da educação como fatores de poder emancipador e de transformação de vidas e almas”. Oliveira também criticou o trabalho infantil como uma prática de restrição de “vida plena” e ressaltou a necessidade de se buscar o desenvolvimento do ser humano em sentido mais amplo, nos aspectos físico, emocional e espiritual.
 
Carta de Campinas
 
 
Na sequência dos trabalhos, a juíza Camila Ceroni Scarabelli, coordenadora do Juizado Especial da Infância e da Adolescência (Jeia) de Campinas, leu a “Carta de Campinas contra o Trabalho Infantil: Pela infância plena, pela Educação Integral” que destacou, entre outros pontos, a promoção de medidas eficazes para divulgação e conscientização dos direitos da criança, obrigatoriedade de abolição de todas as formas de trabalho precoce e incentivo à aprendizagem profissional de adolescentes e jovens, implementação de políticas públicas voltadas à eliminação das piores formas de trabalho infantil e de todas as suas formas até 2025, o cumprimento da Constituição Federal de proteção da criança de não trabalhar antes da idade mínima e o combate às fraudes trabalhistas que envolvam crianças e adolescentes que estão no mercado de trabalho, com privação de direitos, em atividades inseguras e desprotegidas.
 
 
A Carta recebeu a assinatura da presidente do TRT-15, desembargadora Gisela Rodrigues Magalhães de Araujo e Moraes, dos desembargadores Tereza Aparecida Asta Gemignani, vice-presidente judicial da Corte, João Batista Martins Cesar, presidente do Comitê de Erradicação ao Trabalho Infantil do TRT-15, Maria Inês Corrêa de Cerqueira César Targa, diretora da Escola Judicial da 15ª, do procurador-chefe do MPT em Campinas, Dimas Moreira da Silva, do arcebispo de Campinas, Dom Inácio Müller e dos doze juízes do trabalho que coordenam os Jeias na 15ª Região. 
 
Protagonismo no combate ao trabalho infantil 
 
 
“Brasil: A importância e envolvimento da Justiça do Trabalho no Combate ao Trabalho Infantil” foi o tema da conferência de abertura do seminário, que teve como apresentador o desembargador Ricardo Regis Laraia, e como palestrante o juiz do trabalho aposentado e ex-gestor regional e nacional do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem do TST/CSJT, José Roberto Dantas Oliva.
 
 
O palestrante, de início, ressaltou a imprescindibilidade de se conhecer a dimensão histórica para a compreensão do direito, e por isso traçou um panorama da evolução das leis de proteção ao trabalho, mais especificamente as leis de proteção contra o trabalho de crianças e adolescentes. O primeiro registro no mundo, segundo o juiz Dantas Oliva, foi na Inglaterra do século XIX, quando o Moral and Health Act, de 1802, proibiu o trabalho noturno e a jornada superior a 12 horas para crianças, além de instituir a obrigatoridade da educação básica de quatro anos para as crianças. A encíclica Rerum Novarum, de 1891, assinada pelo papa Leão XIII, também foi um marco na luta pelos direitos dos trabalhadores, e com relação às crianças, especificamente, o texto papal ressalta a necessidade de se proteger a infância contra o trabalho em uma oficina, em substituição ao trabalho de um “homem válido”, sob pena de se ver a criança “murchar, como uma planta ainda tenra”, e comprometer sua educação. Nesse caminhar pela história da evolução das leis e direitos, o palestrante ressaltou o engajamento do Brasil, a partir de 1992, ao Programa de Eliminação do Trabalho Infantil da OIT, quando o País contava com aproximadamente 8 milhões de crianças trabalhando, e da Justiça do Trabalho, a partir de 2012. Oliva também creditou ao ex-ministro do TST João Oreste Dalazen, presidente daquela instituição no biênio 2011-2013, a responsabilidade por esse engajamento. Num vídeo exibido durante a palestra, o ministro Dalazen afirma ser, ele mesmo, uma prova dos prejuízos do trabalho na infância pobre, e confessou nunca ter lido, quando menino, uma história em quadrinhos, ou assistido a um desenho infantil, mas que “se salvou” por influência de sua mãe, que não permitiu que ele abandonasse a escola. O magistrado não escondeu que traz “marcas profundas na alma” e que se transformou num “homem sério demais”, e lamentou a falta de atividades lúdicas em sua infância. 
 
 
Dantas Oliva reconheceu esse engajamento da Justiça do Trabalho no combate ao trabalho infantil como um “esforço histórico”, que teve, entre outros frutos, a criação da Comissao Nacional sobre Trabalho Infantil, com sua proposta de Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem. O palestrante ressaltou também a importante vitória na Câmara dos Deputados, nesta semana (4/12), onde se discutia em seis diferentes Propostas de Emenda à Constituição (PEC) a redução para 14 anos da idade mínima de trabalho no Brasil e que teve, pelo voto do deputado João Roma, a legitimação da inadmissibilidade da proposta, como forma de defender a plena infância e juventude. 
 
Dantas Oliva afirmou ainda que, “muito mais importante que criminalizar as práticas do trabalho infantil, é o debate social e a conscientização”, mas confessou que espera que a Câmara dos Deputados acabe de vez com essa discussão “estapafúrdia de redução da idade mínima para o trabalho”, que para ele representa  “um retrocesso social”. Nesse sentido, o engajamento de pessoas famosas e autoridades, como o próprio papa Francisco, em 2016, “abençoando” o esforço do TRT-15 nessa luta, ou a propaganda veiculada na televisão (sem cobrança de cachê) por famosos como Neymar, Dira Paes ou Mário Sérgio Cortella é fundamental.
O palestrante destacou também o papel do TRT-15 no cenário nacional, com sua experiência inédita de criação dos Juizados Especiais da Infância e da Adolescência (Jeias), uma referência no País, reconhecida até mesmo pela Corregedoria Nacional de Justiça.
 
 
Por fim, Dantas Oliva apresentou um vídeo em que crianças com menos de quatro anos trabalham em fábricas de farinha no Norte, na companhia de seus pais, descascando mandioca numa atividade perigosa até mesmo para adultos, e concluiu que nessa luta pela erradicação do trabalho infantil o comprometimento deve ser de todos, “sem romantização nem fortalecimento de mitos”, mas com empatia, “imaginando sempre que um de nossos entes queridos pudesse estar no lugar dessas crianças”.  
 
 
 

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