Cervejaria que exigiu trabalho excessivo de empregado com deficiência terá que pagar indenização

Uma cervejaria foi condenada a pagar indenização por danos morais de R$ 5 mil por não respeitar as condições físicas de ex-empregado contratado na cota de pessoas com deficiência (PCD) quanto à função exercida. A decisão é do juiz Ricardo Gurgel Noronha, em sua atuação na 6ª Vara do Trabalho de Betim.

Na reclamação trabalhista, o autor relatou que foi admitido dentro da cota PCD (pessoas com deficiência). Pela lei brasileira, é considerada PCD a pessoa que possui deficiências visual, auditiva, física, intelectual ou múltiplas. A contratação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho está definida na Lei 8.213/1991, conhecida como Lei de Cotas. De acordo com essa lei, empresas com 100 ou mais empregados são obrigadas a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência.

No caso, o trabalhador explicou possuir limitação física consistente na diferença de 4,5 centímetros entre um membro inferior e outro. Mesmo assim, segundo ele, tinha que carregar saco de malte e descarregar carretas no trabalho. Alegou ainda que, apesar de a empresa ter conhecimento de suas limitações, teve que retornar às atividades sem qualquer adaptação quando ainda se recuperava de uma cirurgia.

Em defesa, a cervejaria sustentou que: “De fato o obreiro foi contratado como PCD, sendo que a reclamada desde o primeiro dia de trabalho do mesmo o adequou em atividade compatível com suas condições físicas, ou seja, jamais realizou atividades diversas”.

Ao analisar as provas, o magistrado constatou que, ao contrário do que alegou, o empregado não realizava descarregamento ou carregamento de peso. Ficou demonstrado que ele apenas acompanhava o descarregamento feito, validando a nota fiscal da carga e lançando-a no sistema. Já o descarregamento de carretas foi confirmado pelas provas.

Para o julgador, é certo que o autor não poderia carregar pesos em razão da sua limitação física. A situação foi considerada capaz de ensejar dano moral. “É notória a angústia e sofrimento de quem tem lesão física, com dificuldades de andar e, por óbvio, permanecer por muito tempo em pé, tendo que carregar caixas de 15/20 quilos, fazer movimentos repetitivos, o que, notoriamente, pode causar dor, e por consequência afeta o íntimo do trabalhador, sendo o dano moral, nesse caso, presumido”.

Na decisão, o julgador considerou que a empresa agiu de forma ilícita ao não respeitar as condições físicas do empregado quanto ao exercício do trabalho. Nesse sentido, o magistrado identificou violação ao artigo 89 da Lei 8.213/1991 e aos artigos 8º e 34/37 da Lei 13.146/2018, citando ainda o Anexo II da NR-17, que prevê que “As condições de trabalho, incluindo o acesso às instalações, mobiliário, equipamentos, condições ambientais, organização do trabalho, capacitação, condições sanitárias, programas de prevenção e cuidados para segurança pessoal devem levar em conta as necessidades dos trabalhadores com deficiência”.

O juiz também citou a seguinte jurisprudência do TRT de Minas:

“CONTRATAÇÃO DE PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. TRABALHO EXCESSIVO À SUA CONDIÇÃO. DANO MORAL CARACTERIZADO. Dano moral trabalhista é o agravo ou o constrangimento moral infligido quer ao empregado, quer ao empregador, mediante a violação a direitos ínsitos à personalidade, como consequência da relação de emprego. O dever de indenizar decorre da responsabilidade subjetiva do agente, seja por dolo, seja por imprudência, negligência ou imperícia, tanto na prática de ato comisso quanto na prática de ato omissivo. A contratação de deficiente físico sem a observância de suas limitações físicas, imputando-lhe atividades laborativas incompatíveis com suas restrições ou mesmo permitindo que tal situação ocorresse, como se trabalhador comum fosse causando-lhe o agravamento de sua condição física, gera a obrigação de reparação do dano sofrido. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0011361-04.2014.5.03.0167 (RO); Disponibilização: 14/08/2015, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 88; Órgão Julgador: Terceira Turma; Relator: Milton V.Thibau de Almeida)”.

Por tudo isso, com base na legislação pertinente, o magistrado julgou procedente o pedido de indenização por danos morais. Ao fixar o valor a ser pago ao trabalhador em R$ 5 mil, levou em conta a conduta do ofensor, capacidade financeira das partes, caráter pedagógico da pena, princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além da tentativa de se evitar o enriquecimento sem causa. Em grau de recurso, a Oitava Turma do TRT-MG confirmou a sentença nesse aspecto. O processo já foi arquivado definitivamente.

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