Dia Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho (27/7): Caso do trabalhador morto após desabamento de torre de energia

Nesta quinta-feira, 27 de julho, celebramos o Dia Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho, data escolhida para reforçar na sociedade a cultura da prevenção dos acidentes de trabalho e das doenças ocupacionais, por meio de campanhas de conscientização. A data foi escolhida em 1972, ano em que o então ministro do Trabalho, Júlio Barata, publicou as Portarias nº 3.236 e 3.237, que regularizavam a formação técnica em segurança e medicina do trabalho, tornando o serviço obrigatório para empesas com mais de 100 empregados.

Os acidentes de trabalho não ocorrem por acaso. Os motivos são variados: falta ou uso incorreto dos equipamentos de proteção individual (EPIs), negligência da empresa em relação ao ambiente de trabalho, falta de treinamento e capacitação para realizar determinadas funções ou falta de atenção dos empregados na realização das tarefas, entre outras.

Diante dos avanços tecnológicos, é necessário atualizar e aprimorar as leis protetivas, considerando as mudanças nos processos de trabalho e os novos conhecimentos científicos na área de segurança e saúde no trabalho. Até mesmo os trabalhos urgentes e arriscados podem ser planejados e executados com segurança.

Com o intuito de evitar ou amenizar os acidentes em altura, foi criada em 2010 a Norma Regulamentadora 35 (NR-35), que estabelece os requisitos e as medidas de prevenção necessárias para a segurança e a saúde dos trabalhadores envolvidos com as atividades em altura, para regulamentar todas as atividades realizadas acima de dois metros de desnível e que forneçam risco de queda. Desde o dia 3 de julho de 2023, entrou em vigor a nova redação da NR-35, dada pela Portaria MTP nº 4.218, de 20/12/2022, que fixou três etapas para a sua entrada em vigor. A primeira etapa, em vigor no início de julho, abrange o corpo da norma, bem como os Anexos I (Acesso por cordas) e II (Sistemas de Ancoragem). A segunda etapa entrará em vigor em 2 de janeiro de 2024 e orientará sobre o uso de escadas. Há ainda mais alguns subitens, que entrarão em vigor em 2 de janeiro de 2025.

As alterações na norma NR-35 incluem: exigência de que o Sistema de Proteção contra Quedas (SPQ) atenda às normas técnicas nacionais ou, na sua inexistência, às normas internacionais aplicáveis, vigentes à época de sua fabricação ou construção; e inclusão da exigência de inspeções iniciais, rotineiras e periódicas do Sistema de Proteção Individual contra Queda (SPIQ), observadas as recomendações do fabricante ou projetista. 

A Justiça do Trabalho mineira recebe muitas ações sobre trabalho em altura, um dos que mais contribui para o elevado número de acidentes. A matéria especial de hoje mostra um desses casos. Acompanhe: 

Mãe de trabalhador morto em Betim após queda da torre de energia será indenizada em R$ 750 mil

 No período em que atuou na 2ª Vara do Trabalho de Betim, o juiz Osmar Rodrigues Brandão determinou o pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 750 mil, à mãe do trabalhador vítima de acidente de trabalho fatal após a queda de uma torre de transmissão de energia da empregadora. Quanto ao pagamento da indenização por danos materiais, o magistrado facultou à empresa o cumprimento da obrigação em parcela única ou de forma mensal, mediante inclusão do valor da pensão em folha de pagamento e constituição de capital. Em caso de opção pelo pagamento em quantia única, para que não haja dúvida, os julgadores da Quarta Turma do TRT-MG decidiram que deverá ser aplicado o redutor de 30%, de modo a compensar eventuais lucros ou juros que a autora teria com aplicação do valor recebido.

O caso

O acidente aconteceu no dia 19/7/2019, no pátio de teste de torres da empresa, localizado no bairro Jardim Riacho das Pedras, em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

O trabalhador exercia o cargo de montador vertical. Segundo o encarregado da empregadora, naquela manhã, uma equipe trabalhava normalmente na montagem de uma torre de teste. “Após fixar os pés do equipamento, o trabalhador subiu para soltar a grua e retirar a manilha de conexão. Mas o vento aumentou, fazendo com que a torre caísse junto com o ex-empregado”. Com a queda, o ex-empregado sofreu traumatismo craniano e faleceu no local.

O relatório de Análise de Acidente de Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho em Minas Gerais mostrou que a empresa produz torres de transmissão de energia elétrica e testa as unidades em um pátio próprio. No dia do acidente, trabalhava no local uma equipe encarregada de montar, testar e desmontar as torres para entrega aos clientes. Após a montagem de cada torre, o que leva em média 15 dias, a equipe realiza os ensaios necessários para o teste. Na sequência, o equipamento é desmontado e enviado ao cliente.

Defesa

Em sua defesa, a empregadora insistiu na tese de que já tinha adotado todas as medidas preventivas possíveis e que o acidente se deu por “força maior” ou o que se poderia denominar como tese da “culpa exclusiva do vento”. Porém, para o julgador, “essa conduta, diante de tudo que consta dos autos, pode ser tida como desleal e subsumida em todas as hipóteses do artigo 80 do CPC, do que fica a ré advertida em caso de insistência”.

O julgador destacou que, quanto aos fatores causais consignados no Relatório de Análise do MTE, a própria empregadora apresentou como causas do acidente: a rajada inesperada de vento forte, ocasionando o movimento involuntário do pé da torre em montagem, e, ainda, a quantidade insuficiente de estais (estaios ou ancoragens) na base do equipamento. “Ou seja, segundo a declaração da própria empresa constante do relatório – que pode ser tomada por confissão, nos termos do artigo 389 do CPC, ou, no mínimo, prevalece o teor do documento em si, público (CPC 405) – ela admitiu claramente que as causas do acidente não se resumem à força do vento”, ressaltou o julgador.

Para o magistrado, não há dúvida de que a atividade desenvolvida pela indústria apresentava exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva de ocasionar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade. “Porém, o que se tem no caso é que o risco foi criado ou acentuado em demasia pela negligência da empresa com as medidas preventivas que já deveriam ter sido adotadas, além da imprudência em submeter o trabalhador à variação de intensidade do vento presente em local a céu aberto”, pontuou o juiz.

Em síntese, o juiz reconheceu que a responsabilidade da empregadora se dá, senão pela modalidade objetiva, por culpa que considerou gravíssima ou até mesmo dolo eventual. “Está evidente que, com a negligência, precariedade e imprudência, a empregadora assumiu o risco do resultado, que foi a morte do trabalhador”.

Danos morais

O magistrado asseverou que, no caso da perda de um filho, o dano moral é simplesmente incomensurável. “A extensão do dano, no caso de perda de um filho, mostra-se incomensurável e a indenização em pecúnia, por maior que seja, funciona apenas como um paliativo”.

Para o julgador, em se tratando de acidente do trabalho, é preciso ter em mente, ainda que para a efetividade do combate ao grande número de acidentes de trabalho típicos ou equiparados, o caráter pedagógico das indenizações. “Do ponto de vista do indenizado, vale frisar: o enriquecimento não será sem causa, quem deu a causa foi a própria empresa. E, em que pese não haver tabela para a indenização por danos morais, no intuito de tentar certa racionalidade, a jurisprudência oferece parâmetros”.

No caso, o magistrado ressaltou que a peculiaridade consiste na postura de inação demonstrada pela indústria frente ao acidente fatal. “Isso porque, a par da série de medidas preventivas não adotadas, da série de fatores causais do acidente e do plano de ações proposto por ela no relatório técnico, a empresa insiste na tese de que o acidente foi culpa do vento”.

Para o juiz Osmar Rodrigues Brandão, considerando que o vento não é fator da natureza “inesperado”, a empresa normaliza por demais o acidente fatal ocorrido, deixando transparecer que outros casos poderiam continuar ocorrendo e nenhuma culpa ela teria. “Tal postura é muito preocupante e, por isso, desafia que a indenização seja arbitrada com atenção especial para o efeito pedagógico, que somente será alcançado em montante que sirva de estímulo contra a inércia demonstrada”.

Considerando então a extensão do dano, o grau de parentesco da autora da ação com a vítima, a gravidade da culpa da empresa, o duplo caráter reparador-pedagógico e o capital social, o magistrado arbitrou a indenização por danos morais em R$ 750 mil.

O valor arbitrado foi acima do total estimado sugerido pela autora. A decisão do magistrado levou em consideração a jurisprudência iterativa e notória do STJ: “(…) 1. O magistrado, ao arbitrar a indenização por danos morais, não fica vinculado ao valor meramente estimativo indicado na petição inicial (AgInt no AREsp 1389028/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 11/4/2019, DJe 8/5/2019)”.

Danos materiais

Na ação, a mãe da vítima pediu para que a empregadora mantivesse apenas a contribuição que o filho oferecia para auxiliá-la, referente ao pagamento da conta de luz e de uma cesta básica mensal. Na época dos cálculos, a soma desses dois auxílios correspondia a uma quantia superior a 1/3 do salário mínimo. O juiz julgou procedente o pedido de pensão mensal, no equivalente a 1/3 (um terço) do salário mínimo, desde a data do óbito, quando o falecido contava com 32 anos de idade (certidão de óbito juntada ao processo), até a data em que ele completaria 65 anos de idade ou a autora completaria 78 anos (limites do pedido) – o que ocorrer primeiro. Dessa forma, foi descartada a tese patronal de que a pensão mensal deferida ultrapassava os limites do pedido. Ao contrário, o juiz fixou um valor menor para a pensão mensal do que o pedido pela mãe do trabalhador falecido.

O magistrado facultou à empresa o cumprimento da obrigação em parcela única ou de forma mensal, mediante inclusão do valor da pensão em folha de pagamento e constituição de capital. Entretanto, ele registrou na sentença que, em caso de opção pelo pagamento em quantia única, se houver falta de consenso das partes, o valor devido deverá ser apurado por cálculo atuarial considerando os parâmetros descritos na sentença, ou ainda, com simples aplicação de redutor, a critério do juízo da execução.

A empresa recorreu ao TRT de Minas. Com o objetivo de tornar a decisão mais exata e evitar futuras discussões em fase de execução, os julgadores da Quarta Turma do TRT-MG deram provimento ao recurso da empresa para determinar que, em caso de pagamento da indenização pelos danos materiais em parcela única, deverá ser aplicado o redutor de 30%, de modo a compensar eventuais lucros ou juros que a autora teria com aplicação do valor recebido, podendo gerar enriquecimento sem causa se isso ocorresse.

O processo foi remetido ao TST, para exame do recurso de revista, e, depois, retornou à vara de origem, para prosseguir na fase de execução. Ao final, as pessoas envolvidas celebraram um acordo e o processo foi arquivado definitivamente.

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